Quando construímos uma casa, sempre cuidamos para que cada detalhe fique do jeito que queremos. Definimos quais e quantos cômodos a nova casa vai ter, decidimos seus tamanhos e disposição, verificamos a posição de portas e janelas e a ventilação dos ambientes. Depois escolhemos cuidadosamente o piso, a cor das paredes, esquadrias, revestimentos, luminárias, uma infinidade de detalhes, enfim, para que nossa casa fique perfeita.
Da mesma maneira, quando compramos uma nova casa, observamos sua localização, seu tamanho e a divisão de seus ambientes. Então decidimos se vamos fazer modificações, pintá-la, escolhemos novas cores e acabamentos. Por fim, móveis, cortinas, tapetes, para dar o toque final e personalizar o ambiente.
E o jardim ? Do jardim cuidamos depois......
Quando todo o mais está pronto é que decidimos como vamos fazer o jardim. O jardim é tratado como um complemento, de importância secundária. Ocupa o que “sobrou” do terreno, a parte que não quisemos ou não pudemos ocupar com a construção. Nesse espaço distribuem-se algumas plantas de efeito ornamental, completa-se o espaço restante com grama e, voilà, tem-se um jardim!
Mas um jardim pode ser muito mais do que isso
Vivemos numa região tropical, com clima quente ao longo de todo o ano. Não há razão para nos escondermos dentro de casa. As áreas externas são tão importantes quanto as internas e merecem o mesmo cuidado. Jardins não precisam ser somente ornamentais e contemplativos, mas verdadeiros espaços de convivência. O jardim é parte da casa e assim deve ser entendido.
 Boa parte das atividades, que se desenvolvem no interior da construção, pode ocorrer do lado de fora. A brincadeira das crianças, o repouso, a conversa com amigos, as refeições e até mesmo o trabalho, podem ser mais agradáveis sob uma sobra leve e uma brisa fresca, em meio aos pássaros e à explosão de cores das flores. Para isso, é preciso que o jardim seja preparado, que receba em seu planejamento o mesmo tratamento e os cuidados que destinamos ao planejar as áreas internas.
Um jardim bem sucedido não é fruto do acaso, mas resultado de um planejamento minucioso, integrado ao projeto de arquitetura. Nesse processo, o espaço que circunda a construção, independentemente de seu tamanho, é trabalhado de forma a integrar-se às áreas internas, transformando-o em parte dela. Os ambientes externos são preparados para abrigar as atividades que se pretendem que ocorram ali. Suas dimensões, características, seu caráter, são definidos de forma que o espaço resultante ofereça o conforto e as condições necessárias para cada uma dessas atividades, convidando e estimulando a permanência de seus usuários.
É claro que beleza é também fundamental. E são principalmente as plantas, com sua riqueza de cores formas e texturas, que, arranjadas de maneira harmoniosa, vão criar as sensações desejadas, a atmosfera do jardim. As plantas são, ao mesmo tempo, as organizadoras do espaço e suas embelezadoras. O posicionamento de cada uma delas no jardim é determinado por suas funções espaciais e pela sua contribuição plástica na harmonia do conjunto proposto.
Não podemos, no entanto, nos esquecer de que mais do que elementos de composição de um jardim, as plantas são seres vivos, com características biológicas que determinam sua aptidão a sobreviver em cada ambiente. Assim, dependendo de sua origem, cada planta tem necessidades diferentes. Há plantas que apreciam o frio ou o calor, o vento ou a ausência deste, umidade elevada ou baixa, chuvas freqüentes ou raras, solos argilosos ou arenosos, e assim por diante. Essas características do ambiente de onde a planta se originou devem ser rigorosamente respeitadas para que a planta possa se desenvolver plenamente. A escolha das espécies que serão utilizadas em cada jardim deve se guiar por esse critério, sendo também etapa de grande importância no processo de planejamento.
 Ao mesmo tempo, vale lembrar que cada decisão tomada durante o planejamento tem impacto direto sobre o nível de manutenção que o jardim proposto exigirá, sobre a freqüência e a dificuldade dos cuidados que serão necessários para que o jardim possa se desenvolver e atingir sua plenitude. É possível criar um jardim rústico e pouco exigente ou optar por uma solução mais elaborada que, no entanto, exija manutenção intensa e mais onerosa. Ainda com relação a custos, é somente com planejamento prévio que podemos determinar o custo de implantação do jardim, ou ajustá-lo a um orçamento pré-determinado. Dependendo da facilidade de propagação da planta, de sua velocidade de crescimento e do porte de aquisição proposto, o valor das mudas pode variar enormemente. É preciso determinar o equilíbrio entre custos e benefícios de cada um desses fatores no momento em que se opta por determinada espécie vegetal.
O planejamento do jardim permite que todos esses fatores inter-relacionados sejam considerados em conjunto, de forma equilibrada. O resultado final desse processo é um espaço harmônico, dinâmico, integrado à construção e a seus usuários, contemplando seus gostos e interesses, convidativo e hospitaleiro. Ao mesmo tempo, biologicamente equilibrado, respeitando as características de cada planta e seu comportamento no conjunto, e as características da fauna e flora locais. E ainda, com um custo pré-determinado e um nível de manutenção adequado. Será preciso dizer mais?
Por Marcos Malamut - Arquiteto, paisagista e coordenador da ProFlora
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